terça-feira, 26 de abril de 2016

o ouvido aberto a todo som e o senso

fresco não saber medir o peso os paus

dos homens pelados das revistas e à noite

voltar a sentir medo de si mesmo futuro

pode ser esquizofrênico que me importa

eu tenho todas as chances

perdidas por receio de que dê certo que

me importa a volta aos dezessete estala

no primeiro acorde do New Order

e o ciático e o estômago e a próstata

gasta um respiro que acomoda

o corpo ao todo o todo ao tempo

tudo que adolesce o tempo todo

segunda-feira, 25 de abril de 2016

fugir dos fatos dos atos dos tropeços e trapaças

dos dias esconder-se das mensagens dos chamados e dos olhos da família

me trouxe a esta savana ameaçada e minúscula a minha cama

onde manadas de antílopes saltitam enquanto fogem da fome dos felinos

entre o escuro da postura planetária e o amarelo das paredes desta casa alugada

na secura do quadrilátero abarrotado do meio do continente sul-americano

que aniquilada a floresta amazônica vai deixar de irrigar então de fato uma savana

recupero o sumo selvagem a saliva da caça e amanhã recomeço a perder eles

domingo, 17 de abril de 2016

feliz é a nação

E estando reunidos os homens do povo na casa que lhes dava nome, tratavam com pombos e asnos aos gritos vendendo-os entre uns e outros enquanto invocavam o nome do Senhor;

e eis que o Senhor vendo aquilo chamou Seu anjo e lhe disse: desce ao meio dos homens a anuncia a eles a minha chegada,

pois que chamaram o Senhor, e o Senhor atenderá. Eu sou o Deus de Jacó, Senhor dos Exércitos, a Paz de Jerusalém.

E descendo o anjo entre os homens, soou a vuvuzela anunciando Regozijai-vos, ó justos, pois o Senhor ouviu os vossos clamores, e sendo vós retos, Ele estará entre vós.

E disse o anjo: Tema toda terra ao Senhor; temam-no todos os moradores do mundo.

Ouvindo o anúncio do anjo, os homens se regozijaram, e houve grande festa entre eles.

E cortaram os testículos dos asnos para banhar-se com seu sangue, pois diziam O Senhor é bom, ele estará entre nós.

E aos pombos os homens deceparam com seus dentes, e violentaram as mulheres do povo, pois diziam Eis que tememos ao Senhor, e somos retos, e os olhos do Senhor estão sobre nós;

não restará entre nós pecador ou mulher do povo para que a ira do Senhor não se abata sobre nossa casa.

E seviciaram-se entre si, cortando-se de morte com lâminas e dentes, a eles e a suas mulheres, e a todos os pecadores da nação, até que sobraram apenas os justos. E desfizeram o conselho dos gentios, e cantavam com o saltério e um instrumento de dez cordas, louvando o nome do Senhor.

E os ímpios foram varridos da nação, pois a ira de Deus se abateu sobre eles, e suas mulheres foram feridas de morte e morreram.

Vendo aquilo, o Senhor se alegrou, e disse ao anjo Vai lá, toca a vuvuzela e anuncia o que te digo:

Eu sou o Senhor, Deus dos Exércitos, que livrou Seu povo do Egito, vosso auxílio, espada e escudo.

Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor, e o povo ao qual escolheu para sua herança. Não esperai mais. Pois eis que vós sois justos, e Eu sou justo.

Em verdade vos digo: vós sois o Senhor.

Ouvindo isso, os homens se regozijaram. E houve grande festa entre eles.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

no fim
das contas
o que se escreve só interessa mesmo
a quem escreve e depois
por um acaso
muito imprevisível
ou talvez nem tanto
porque tem vestibulares e outras instituições
que direcionam os textos e os destinatários
a um mesmo destino

mas mesmo assim
é um acaso o que dita
que eu tenha me emocionado
com a morte do cachorro retirante
aos dezessete anos
e não com o casamento de fachada
no romance do Alencar
como a minha amiga Tayce

é que o que se escreve
no fim
das contas
só interessa mesmo
a quem escreve
e por acaso
só mesmo por um acaso
bem casual
a alguém que leia
mesmo que seja décadas
ou séculos
depois

então eu numa noite de insônia
posso ficar tranquilo
entre sílabas
estou muito bem acompanhado
pelo fantasma incerto
de um leitor desconhecido

eu
que me interesso a mim, de repente
também
interesso a ele

o mundo tem hoje mais de sete bilhões de pessoas

o texto
teso
une o telefone de latinhas
de achocolatado
que eu entrego a essa pessoa
num escuro sem tato

por aqui
a gente se fala
eu não escuto
a não ser
o eco
da minha letra

a recompensa que temos
olha só, que engraçado:

eu, me sentir Deus
que deve estar assim
lá na Eternidade
insone balbuciando numa lata
de achocolatado

você, saber que Deus
existe, nem que seja
assim torto, um Deus
talvez já morto, é muito mais
do que muita gente
jamais
vai encontrar

segunda-feira, 11 de abril de 2016

quando morre uma
escritora um escritor
os anjos cochicham ih
lá vem mais uma mais
um, esses chegam cheios
de pompa e timidez perguntam
por deus e onde está a máquina
de escrever primordial os anjos
não aguentam mais ter que dizer
minha senhora meu senhor
aqui não tem nada dessas coisas nós sabemos
depois de tantos anos encharcando
papéis de tinta os dedos duros de tanto
digitar você se sente é
lógico
muito decepcionado decepcionada mas
entenda ninguém
nunca
jamais
te prometeu absolutamente nada e enquanto
na terra as editoras preparam
orelhas elogiosas e os jornalistas copiam
com esmero o press release
com dois comandos de teclado
a escritora o escritor ressuscitados
em fotos e suspiros e deus nos livre até
saraus pelos séculos e os séculos dos séculos
sussurram
poemas sem vida nos trabalhos de mesa espírita é que no céu
o monopólio das palavras está nas asas
dos anjinhos quando morre
uma escritora um escritor percebe
finalmente que as palavras
ruflam
míticas místicas abstratas
e não há deus nem nunca houve
uma máquina
de escrever
primordial