nesses estalos
alguma coisa acorda
o céu se enche de barulho e luz
bobagens que assustam os cachorros
e deixam os adultos excitados
abraços e promessas
os cachorros
não comungam
assustados
aos latidos
brigam
com uma força
com a qual não podem competir
os adultos
se entregam
ao silêncio
e à ressaca
(o começo acaba
nele mesmo)
sábado, 30 de dezembro de 2017
quarta-feira, 27 de dezembro de 2017
estamos todos bem
os filhotes de pomba são muito barulhentos e não param de piar no meu telhado. pensei em matar todos, mas a visão imaginada dos esqueletinhos sucumbidos ao veneno me deu um arrepio de compaixão e de tristeza. prefiro ficar irritado do que triste. acho.
quem também se irrita são os cachorros, que latem a cada piado. e me irritam mais ainda. não sei como a casa sobrevive. ela só fica de pé porque piados e latidos não são o bastante pra demolir prédios. se fossem, não sobrava pedra sobre pedra. eu já teria destruído toda a cidade de São Paulo. no latido.
então dou bronca nos cachorros e eles, contrariados, resmungam e param de latir. pelo menos por um tempo. ficamos assim: o pombinho piu, o cachorro au, eu chiu, um looping infernal.
o lado bom é que estamos todos vivos e bem. se irritar tem que ser um sinal de saúde, de bicho que está acordado e que se rebela. os pombinhos mesmo devem estar muito irritados com a fome ao relento. se eles pudessem, tenho certeza que comiam meus cachorros e bicavam a minha cabeça até comer os meus miolos. e no entanto estão lá, no telhado. pedindo proteção a algo que talvez eles chamem de: mãe.
quem também se irrita são os cachorros, que latem a cada piado. e me irritam mais ainda. não sei como a casa sobrevive. ela só fica de pé porque piados e latidos não são o bastante pra demolir prédios. se fossem, não sobrava pedra sobre pedra. eu já teria destruído toda a cidade de São Paulo. no latido.
então dou bronca nos cachorros e eles, contrariados, resmungam e param de latir. pelo menos por um tempo. ficamos assim: o pombinho piu, o cachorro au, eu chiu, um looping infernal.
o lado bom é que estamos todos vivos e bem. se irritar tem que ser um sinal de saúde, de bicho que está acordado e que se rebela. os pombinhos mesmo devem estar muito irritados com a fome ao relento. se eles pudessem, tenho certeza que comiam meus cachorros e bicavam a minha cabeça até comer os meus miolos. e no entanto estão lá, no telhado. pedindo proteção a algo que talvez eles chamem de: mãe.
sábado, 23 de dezembro de 2017
vivo num tempo sem relevos
olha
ali
uma duna
ela se move
com o vento
eu tenho os dias dessa viagem comprados
claro
como qualquer turista responsável
filtro solar, gps, caminhos previstos
a pousada é bem limpa e quase
não se veem baratas
antílopes domesticados
hora certa pra avistar golfinhos
soro antiofídico
é verão no hemisfério sul e logo
logo não vai ter diferença
entre um dia e outro dia
planeta de plástico
apocalipse sempre adiado
pro dia seguinte
pra hora
em que eu vou dizer eis
aqui
a minha casa
essa terra arrasada
chegado o momento
de ser duna, de ser vento
as bordas do tempo se fecharão
esperança
bandida
quer dançar
enquanto isso?
olha
ali
uma duna
ela se move
com o vento
eu tenho os dias dessa viagem comprados
claro
como qualquer turista responsável
filtro solar, gps, caminhos previstos
a pousada é bem limpa e quase
não se veem baratas
antílopes domesticados
hora certa pra avistar golfinhos
soro antiofídico
é verão no hemisfério sul e logo
logo não vai ter diferença
entre um dia e outro dia
planeta de plástico
apocalipse sempre adiado
pro dia seguinte
pra hora
em que eu vou dizer eis
aqui
a minha casa
essa terra arrasada
chegado o momento
de ser duna, de ser vento
as bordas do tempo se fecharão
esperança
bandida
quer dançar
enquanto isso?
segunda-feira, 18 de dezembro de 2017
resposta
nem te conto
o quanto
eu ando
me aprumando
eu deito
e sempre
me levanto
eu suo
e sempre
tomo banho
eu como
e cago
e ando
e faço
tudo
que posso
é pouco
mas também
é tanto
eu tento
e isso
é tanto
nem te conto
como
eu ando
eu posso
tudo
que faço
e faço
tudo
que consigo
eu sigo
sem rumo
mas ando
me aprumando
o quanto
eu ando
me aprumando
eu deito
e sempre
me levanto
eu suo
e sempre
tomo banho
eu como
e cago
e ando
e faço
tudo
que posso
é pouco
mas também
é tanto
eu tento
e isso
é tanto
nem te conto
como
eu ando
eu posso
tudo
que faço
e faço
tudo
que consigo
eu sigo
sem rumo
mas ando
me aprumando
domingo, 17 de dezembro de 2017
mundo cão
quando olho o cachorro, sei que a vida tem uma substância própria e alheia a si mesma, uma inteligência sem palavras que adapta a matéria à insistência e à finitude. então o cachorro vem até mim e reconheço os critérios da comunicação, que a vida se interliga a outras coisas, inclusive outras vidas, de modo quase mineral.
ponho a mão no cachorro. ele me lambe ou passa o focinho gelado no meu braço. então perco todo o conhecimento prévio da vida. ela não é mais que afeto e lambidas. algo parecido acontece quando o cachorro late de madrugada e me acorda. então quero afogar ele na bacia, e a vida é só raiva incontida e despertares incômodos.
se não fosse o cachorro, eu teria que saber de mim e não conseguiria. não sei se suportaria a frustração. ou conseguiria. aí, se alguém me olhasse de longe, veria: um cachorro.
ponho a mão no cachorro. ele me lambe ou passa o focinho gelado no meu braço. então perco todo o conhecimento prévio da vida. ela não é mais que afeto e lambidas. algo parecido acontece quando o cachorro late de madrugada e me acorda. então quero afogar ele na bacia, e a vida é só raiva incontida e despertares incômodos.
se não fosse o cachorro, eu teria que saber de mim e não conseguiria. não sei se suportaria a frustração. ou conseguiria. aí, se alguém me olhasse de longe, veria: um cachorro.
quinta-feira, 14 de dezembro de 2017
the summer is tragic
vamos acordar
4 semanas
sem manhã
sem arrumar a cama
100 reais
pruma pizza
pruma noite
pruma vida
prega a promessa
desaparecida
o 13º
da geração passada
são paulo
o mundo inteiro
agora essa
tá com nada
frio na firma
de bermuda bege
segurando as fezes
the summer is tragic
legalizar o corpo
o coito morrer
de encosto
que acabe em barranco
são paulo
eterno
agosto
não fique
afoito
não fique
sem jeito
não fique
sem gosto
assim
não tem mais jeito
supere
engole seco
suado
no ar condicionado
intróito
e um próspero
enrosco
vem que vem
2018
4 semanas
sem manhã
sem arrumar a cama
100 reais
pruma pizza
pruma noite
pruma vida
prega a promessa
desaparecida
o 13º
da geração passada
são paulo
o mundo inteiro
agora essa
tá com nada
frio na firma
de bermuda bege
segurando as fezes
the summer is tragic
legalizar o corpo
o coito morrer
de encosto
que acabe em barranco
são paulo
eterno
agosto
não fique
afoito
não fique
sem jeito
não fique
sem gosto
assim
não tem mais jeito
supere
engole seco
suado
no ar condicionado
intróito
e um próspero
enrosco
vem que vem
2018
segunda-feira, 11 de dezembro de 2017
você está aqui
no fio
do guizo
do gato
no fungo
da unha
do amor
no lago
do fundo
do oceano
no som
que não
se repete
*
no som
que se lembra
e se perde
no dado
jogado
por deus
no quarto
do fundo
do lago
no guizo
do gato
de alguém
do guizo
do gato
no fungo
da unha
do amor
no lago
do fundo
do oceano
no som
que não
se repete
*
no som
que se lembra
e se perde
no dado
jogado
por deus
no quarto
do fundo
do lago
no guizo
do gato
de alguém
domingo, 3 de dezembro de 2017
quinta-feira, 30 de novembro de 2017
quarta-feira, 29 de novembro de 2017
lamento
São muitos os caminhos
do inexato
tropeçam uns nos outros
passos largos
e buscam um momento
certo
de ter uns aos outros
perto.
Coitados de nós
tão delicados
os joelhos ralados
escorrendo
sem colo nem descanso
mas exaustos
tentando chegar
do outro lado
do inexato
tropeçam uns nos outros
passos largos
e buscam um momento
certo
de ter uns aos outros
perto.
Coitados de nós
tão delicados
os joelhos ralados
escorrendo
sem colo nem descanso
mas exaustos
tentando chegar
do outro lado
cilada
No inexato habitam
as cracas do espírito
que bom, corpo,
em nódoas e metástases
cálculos catarros e fezes endurecidas
você livre dessas porqueiras
depois de morto se dissolve
e Deus me manda para o Inferno
você não soube - ele diz - o tempo todo
nada se pode fazer
contra o Correto.
as cracas do espírito
que bom, corpo,
em nódoas e metástases
cálculos catarros e fezes endurecidas
você livre dessas porqueiras
depois de morto se dissolve
e Deus me manda para o Inferno
você não soube - ele diz - o tempo todo
nada se pode fazer
contra o Correto.
domingo, 26 de novembro de 2017
segunda-feira, 13 de novembro de 2017
Te digo, meu filho:
todos os bichos estão extintos
se você acha que o cachorro
latir é uma prova de vida
o rato e a barata
coxas de galinha
deixando pegadas de carbono
em cada rocha densa
eu me preparo
pra você
um dia findo
como eu
indo até o futuro
do buraco em que o planeta vai cair
você nem veio
e já te tenho
saudades
todos os bichos estão extintos
se você acha que o cachorro
latir é uma prova de vida
o rato e a barata
coxas de galinha
deixando pegadas de carbono
em cada rocha densa
eu me preparo
pra você
um dia findo
como eu
indo até o futuro
do buraco em que o planeta vai cair
você nem veio
e já te tenho
saudades
domingo, 12 de novembro de 2017
Se fica parado muito tempo
em volta do corpo surgem bichos
querendo fazer casa e alimento
Mova-se ou será comido
coma tudo que para
nada escapa do ciclo
É bom saber que sempre
alguém vai me querer
verme inseto ou gente
Bicho do asfalto, bicho do mato
planta minério ou vácuo
tempo concreto, tempo abstrato
em volta do corpo surgem bichos
querendo fazer casa e alimento
Mova-se ou será comido
coma tudo que para
nada escapa do ciclo
É bom saber que sempre
alguém vai me querer
verme inseto ou gente
Bicho do asfalto, bicho do mato
planta minério ou vácuo
tempo concreto, tempo abstrato
sábado, 4 de novembro de 2017
laika
o rabo abanando
e a língua pra fora
da atmosfera
você foi embora
uivando no vácuo
na noite pra sempre
você morre
no espaço pra sempre
ninguém mais escuta
você latindo
na busca perdida
de um amigo
e eu vou sumir
antes que acabe
a sua viagem
de volta pra casa
e a língua pra fora
da atmosfera
você foi embora
uivando no vácuo
na noite pra sempre
você morre
no espaço pra sempre
ninguém mais escuta
você latindo
na busca perdida
de um amigo
e eu vou sumir
antes que acabe
a sua viagem
de volta pra casa
terça-feira, 31 de outubro de 2017
avesso do parnaso
um dos maiores
é o que se diz
do poeta que tira ouro do nariz
e meia dúzia
louva o tal
pois lá no fundo todo mundo é bem igual
grande mesmo
é o vasto mundo
e tão pequeno que -- logo -- fica imundo
de minério
de catota
réguas vagas pensas guias -- tortas
é o que se diz
do poeta que tira ouro do nariz
e meia dúzia
louva o tal
pois lá no fundo todo mundo é bem igual
grande mesmo
é o vasto mundo
e tão pequeno que -- logo -- fica imundo
de minério
de catota
réguas vagas pensas guias -- tortas
segunda-feira, 23 de outubro de 2017
quinta-feira, 5 de outubro de 2017
terça-feira, 3 de outubro de 2017
terça-feira, 26 de setembro de 2017
every man must play a part and mine a sad one
é importante pagar os impostos
e morrer com as contas em dia
deixar boas memórias e um corpo
pra ser observado no velório
um nome também ajuda
a dar destino pra lápide
pros encontros dos colegas póstumos
e pra certidão de óbito
é importante viver plenamente
a morte agradece o seu esforço
e entre bocejos e aplausos
te arrasta pra fora do espetáculo
e morrer com as contas em dia
deixar boas memórias e um corpo
pra ser observado no velório
um nome também ajuda
a dar destino pra lápide
pros encontros dos colegas póstumos
e pra certidão de óbito
é importante viver plenamente
a morte agradece o seu esforço
e entre bocejos e aplausos
te arrasta pra fora do espetáculo
segunda-feira, 25 de setembro de 2017
o cu largo da realidade
o cu largo da realidade
fistado dia a dia
ela é morna e frouxa
ela é suja e úmida
ela aperta
e abriga
e me suga
só
até
o cotovelo
fistado dia a dia
ela é morna e frouxa
ela é suja e úmida
ela aperta
e abriga
e me suga
só
até
o cotovelo
domingo, 24 de setembro de 2017
faxina
tirei o limo do banheiro
não consigo esfregar o limo da alma
algo me diz que a alma não tem limo
e não tem alma
*
setembro nem me lembro
outubro ai que susto
novembro a rima é a mesma
dezembro e não termina o mundo
*
janeiro o ano inteiro
fevereiro, eiro, eiro
março sem abraço
abril o ano inteiro
*
passei cera no chão e vi um filme. mesmo assim, tudo segue pegajoso. amanhã é segunda-feira, mais cedo do que eu esperava. não tem rima nem remédio que salve. nem aliteração. renato russo no vídeo é mais jovem do que eu. tempo perdido.
*
"People always clap for the wrong things. If I were a piano player, I'd play it in the goddam closet."
(The Catcher in the Rye)
*
perseguir o texto errado. come chocolates pequena. fragmentos feios, didático do óbvio. e me esconder até sumir, sem medo. a próxima palavra é uma questão de espera. ela nunca nos pertence.
*
a palavra chega e limpa os pés no sofá. agora de novo a casa fica suja. a palavra peida durante o jantar. e tem um trabuco na cintura ninguém se atreva a bulir com ela. ela me mata um pouco a cada dia. eu sobrevivo porque tenho a saúde muito boa.
*
eu sou um desafio.
não consigo esfregar o limo da alma
algo me diz que a alma não tem limo
e não tem alma
*
setembro nem me lembro
outubro ai que susto
novembro a rima é a mesma
dezembro e não termina o mundo
*
janeiro o ano inteiro
fevereiro, eiro, eiro
março sem abraço
abril o ano inteiro
*
passei cera no chão e vi um filme. mesmo assim, tudo segue pegajoso. amanhã é segunda-feira, mais cedo do que eu esperava. não tem rima nem remédio que salve. nem aliteração. renato russo no vídeo é mais jovem do que eu. tempo perdido.
*
"People always clap for the wrong things. If I were a piano player, I'd play it in the goddam closet."
(The Catcher in the Rye)
*
perseguir o texto errado. come chocolates pequena. fragmentos feios, didático do óbvio. e me esconder até sumir, sem medo. a próxima palavra é uma questão de espera. ela nunca nos pertence.
*
a palavra chega e limpa os pés no sofá. agora de novo a casa fica suja. a palavra peida durante o jantar. e tem um trabuco na cintura ninguém se atreva a bulir com ela. ela me mata um pouco a cada dia. eu sobrevivo porque tenho a saúde muito boa.
*
eu sou um desafio.
poema
guarda
a palavra
no escuro
ela quebra
e gera
estilhaços
que refletem
o que encontram
de luz mínima
e apagam
logo
que ela acaba
valeu
ter quebrado
a palavra
a palavra
no escuro
ela quebra
e gera
estilhaços
que refletem
o que encontram
de luz mínima
e apagam
logo
que ela acaba
valeu
ter quebrado
a palavra
sábado, 23 de setembro de 2017
diário
a gente vive um tempo que não sabe. faz calor e o chão é uma ameaça. a qualquer momento tudo pode ruir ou se romper ou estourar. mas nada ocorre. aos poucos as pessoas vão ficando calmas. se olham e perguntam: então estamos vivos? e se matam. não todos, não ao mesmo tempo. a morte é um exercício. dois continentes de plástico se formam no oceano pacífico. as correntes marítimas são realidades tão distantes. um parente tem câncer, outro é atropelado, a vida: uma antessala. que vai dar em lugar nenhum, então aproveite. imenso e impiedoso agora. ricochete.
caverna
desconheço esses intestinos que trago dentro
são uma espera de correspondência
entre a minha mais tripa e os livros de anatomia
quem sabe tenho flores ou faíscas
no lugar de linguiça
quem sabe são serpentinas
minha fábrica de fezes
corpo pra que te quero
se não reconheço
agradeço
outro mistério
*
o escuro que trago dentro
pode ser luz
presa
o enjoo do pós-remédio
um barco
atlântico
a fome quando não como
um homem
incômodo
são uma espera de correspondência
entre a minha mais tripa e os livros de anatomia
quem sabe tenho flores ou faíscas
no lugar de linguiça
quem sabe são serpentinas
minha fábrica de fezes
corpo pra que te quero
se não reconheço
agradeço
outro mistério
*
o escuro que trago dentro
pode ser luz
presa
o enjoo do pós-remédio
um barco
atlântico
a fome quando não como
um homem
incômodo
sexta-feira, 22 de setembro de 2017
primavera
no asfalto mole as rolas flácidas
tolas ciscam o passado
e passam pelas moelas
as pedras duras do presente
que abandono de vigor nós vivemos
árvores, fuligem, azulejo
nascendo, nascendo, nascendo
tolas ciscam o passado
e passam pelas moelas
as pedras duras do presente
que abandono de vigor nós vivemos
árvores, fuligem, azulejo
nascendo, nascendo, nascendo
quinta-feira, 21 de setembro de 2017
compara
a vida dos gatos
é curta
e bastante
a vida das árvores
se mescla
à paisagem
a vida da gente
é que se
desequilibra
é curta
e bastante
a vida das árvores
se mescla
à paisagem
a vida da gente
é que se
desequilibra
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
trajeto
sou grato ao acaso
um ônibus tem mais de quarenta lugares
não conheço nenhum de vocês
estatística e mistério são consortes
não sou grato a nada
num universo paralelo
bombas caem sobre a cidade
neste eu chego pro trabalho
vida é a espera da morte
pode ser que nem exista
o acaso
mas o ônibus segue
caminho traçado
eu desconheço
um ônibus tem mais de quarenta lugares
não conheço nenhum de vocês
estatística e mistério são consortes
não sou grato a nada
num universo paralelo
bombas caem sobre a cidade
neste eu chego pro trabalho
vida é a espera da morte
pode ser que nem exista
o acaso
mas o ônibus segue
caminho traçado
eu desconheço
domingo, 17 de setembro de 2017
pega leve
sdds 2007
hoje escrever blogue é que nem máquina de escrever
ninguém consegue mais aquela urgência que a gente tinha
quando eu cheguei no google era tudo mato
nunca consegui sair da idade da internet discada
o download não completou
hoje temos muito em jogo
tecnologias de reconhecimento facial
e uma verruga de velha pendendo do nariz
ando gastando mais de mil reais por mês com saúde mental. white people problems. todas as coisas que possuo fui eu que comprei. em busca da vontade de viver. a literatura ficou pra trás. o futuro só deus sabe. em menos de um mês alcanço a idade de cristo. e isto é um registro pros arqueólogos vindouros. verão nossos pixels como nós a cerâmica dos antigos. nenhum nome resiste ao tempo. por isso o de deus não se diz.
mas é domingo como tantos que já passaram. deito com os meus livros e as roupas limpas que não vou guardar. sou tão anônimo quanto o meu vizinho, que também deve estar sofrendo, hoje ou qualquer dia. cada pessoa tem suas verrugas. em 2007 eu pesava uma pessoa a menos
hoje escrever blogue é que nem máquina de escrever
ninguém consegue mais aquela urgência que a gente tinha
quando eu cheguei no google era tudo mato
nunca consegui sair da idade da internet discada
o download não completou
hoje temos muito em jogo
tecnologias de reconhecimento facial
e uma verruga de velha pendendo do nariz
ando gastando mais de mil reais por mês com saúde mental. white people problems. todas as coisas que possuo fui eu que comprei. em busca da vontade de viver. a literatura ficou pra trás. o futuro só deus sabe. em menos de um mês alcanço a idade de cristo. e isto é um registro pros arqueólogos vindouros. verão nossos pixels como nós a cerâmica dos antigos. nenhum nome resiste ao tempo. por isso o de deus não se diz.
mas é domingo como tantos que já passaram. deito com os meus livros e as roupas limpas que não vou guardar. sou tão anônimo quanto o meu vizinho, que também deve estar sofrendo, hoje ou qualquer dia. cada pessoa tem suas verrugas. em 2007 eu pesava uma pessoa a menos
sábado, 16 de setembro de 2017
o anti dia d
o mundo dá sinais de cansaço, bobagem
o mundo não dá sinais
nem ponteiros nem planetas deixam ver
o que está acontecendo
fósseis dormem tranquilos e nunca serão encontrados
tudo o que é vivo vai morrer
metralha verdades na parede do nada
quem sabe onde vamos chegar
e no entanto o corpo sua
com esse calor que se abate
dois mil e dezessete ano zero antropoceno
tufões nunca vistos pela espécie
nos põem pra suspirar
entre veias e artérias
circulam verbos que só se conjugam no infinitivo
no osso
sinto um poço
me afundando
o mundo não dá sinais
nem ponteiros nem planetas deixam ver
o que está acontecendo
fósseis dormem tranquilos e nunca serão encontrados
tudo o que é vivo vai morrer
metralha verdades na parede do nada
quem sabe onde vamos chegar
e no entanto o corpo sua
com esse calor que se abate
dois mil e dezessete ano zero antropoceno
tufões nunca vistos pela espécie
nos põem pra suspirar
entre veias e artérias
circulam verbos que só se conjugam no infinitivo
no osso
sinto um poço
me afundando
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
nem morto nem tão vivo
naquele tempo eu não tinha medo de nada
nem me lamentava já tenho mais de trinta
e vivo num século sem força
fiz tudo antes do retorno de saturno
depois escrever virou um pêndulo
entediado sobre os abismos da morte
meu deus estamos presos no fracasso
a pessoa mais low profile que você vai conhecer
se esgueirando pelas saídas da História
abençoadas sejam as técnicas de sobrevivência
e o risco da morte que te atualiza
enquanto os impostos mastigam teu cadáver adiado
é festa a cada dia no incógnito do universo
não veremos nada disso valer a pena
meu pai morreu sem conhecer os netos
que, contudo, ainda não nasceram
venha, acaso, e me cubra
de progresso
nem me lamentava já tenho mais de trinta
e vivo num século sem força
fiz tudo antes do retorno de saturno
depois escrever virou um pêndulo
entediado sobre os abismos da morte
meu deus estamos presos no fracasso
a pessoa mais low profile que você vai conhecer
se esgueirando pelas saídas da História
abençoadas sejam as técnicas de sobrevivência
e o risco da morte que te atualiza
enquanto os impostos mastigam teu cadáver adiado
é festa a cada dia no incógnito do universo
não veremos nada disso valer a pena
meu pai morreu sem conhecer os netos
que, contudo, ainda não nasceram
venha, acaso, e me cubra
de progresso
quinta-feira, 11 de maio de 2017
olhando um policial
dê-lhe um cassetete e um capacete
desde sempre isso funciona
armas de longo alcance só aprimoram
esse jeito antigo de criar alguém melhor
tornando ele pior
as botas dão dureza aos pés
que, de resto, também doem
a farda é uma roupa como outra qualquer
vem em várias cores, formas e texturas
desde que venha sempre igual
você é igual só aos iguais
que parecem poucos, com todo esse aparato
mas você é qualquer um - e, pelado,
é diferente até dos teus
e igual a todo mundo
dá pena e medo essa sua identidade
tão frágil performance da força
você não consegue
ser melhor que isso?
desde sempre isso funciona
armas de longo alcance só aprimoram
esse jeito antigo de criar alguém melhor
tornando ele pior
as botas dão dureza aos pés
que, de resto, também doem
a farda é uma roupa como outra qualquer
vem em várias cores, formas e texturas
desde que venha sempre igual
você é igual só aos iguais
que parecem poucos, com todo esse aparato
mas você é qualquer um - e, pelado,
é diferente até dos teus
e igual a todo mundo
dá pena e medo essa sua identidade
tão frágil performance da força
você não consegue
ser melhor que isso?
segunda-feira, 27 de março de 2017
eu e o medo
a cada momento
nasce um novo medo
ele me olha, medonho
e treme amedrontado
é que nem todos os filhotes: indefeso
e o mundo é dele
eu saio correndo e o medo vem atrás
me querendo
até que ele cresce
tanto que eu nem o vejo
e vai viver sozinho
o mundo é habitado
por medos emancipados
eu fico tranquilo
andando entre eles
não tenho mais susto
até que à frente
(até tinha esquecido!)
outro medo aparece
e a gente começa
tudo de novo
nasce um novo medo
ele me olha, medonho
e treme amedrontado
é que nem todos os filhotes: indefeso
e o mundo é dele
eu saio correndo e o medo vem atrás
me querendo
até que ele cresce
tanto que eu nem o vejo
e vai viver sozinho
o mundo é habitado
por medos emancipados
eu fico tranquilo
andando entre eles
não tenho mais susto
até que à frente
(até tinha esquecido!)
outro medo aparece
e a gente começa
tudo de novo
quarta-feira, 15 de março de 2017
os livros novos
estão ficando velhos
olha como essa página
cheirada em livraria agora há pouco
amarela
uns pontos de fungos
denunciam o trópico
o mau uso
as mudanças de casa em malas improvisadas
os livros são rápidos
enquanto meu ciático dá sinais de cansaço
enquanto as costas pedem alongamento periódico
enquanto a joanete cresce e me dá medo de estourar os sapatos
os livros
sem aviso
feito um retrato guardado na prateleira
adiantam a morte
indiferentemente
estão ficando velhos
olha como essa página
cheirada em livraria agora há pouco
amarela
uns pontos de fungos
denunciam o trópico
o mau uso
as mudanças de casa em malas improvisadas
os livros são rápidos
enquanto meu ciático dá sinais de cansaço
enquanto as costas pedem alongamento periódico
enquanto a joanete cresce e me dá medo de estourar os sapatos
os livros
sem aviso
feito um retrato guardado na prateleira
adiantam a morte
indiferentemente
o pé
de café
do quintal
foi tomado
por uma planta
trepadeira de flores
roxas e gordas que se abrem
de manhã e se fecham à tarde
agora
ele pende sob o peso
dessa amiga e inimiga
à gravidade
ambas podem despencar
a qualquer momento
e as flores brancas do café
embaralhadas no lilás que empalidece
vão secar e apodrecer na chuva e no sol
que metáfora
óbvia
da vida
de café
do quintal
foi tomado
por uma planta
trepadeira de flores
roxas e gordas que se abrem
de manhã e se fecham à tarde
agora
ele pende sob o peso
dessa amiga e inimiga
à gravidade
ambas podem despencar
a qualquer momento
e as flores brancas do café
embaralhadas no lilás que empalidece
vão secar e apodrecer na chuva e no sol
que metáfora
óbvia
da vida
sábado, 25 de fevereiro de 2017
não sei que mistério de sinapse
ou descaminho químico
que os médicos persigam sem sucesso
me impede a alegria nos dias da espécie
seminários acadêmicos
pensam a psique do capitalismo contemporâneo
negros servem brancos
melhores roupas que possuem
um homem mais velho
me diz que nada vale a pena
e não me deixa concordar
mas o amor
esse algodão encharcado de sangue quente
coagula, como o sol é bonito!
ou descaminho químico
que os médicos persigam sem sucesso
me impede a alegria nos dias da espécie
seminários acadêmicos
pensam a psique do capitalismo contemporâneo
negros servem brancos
melhores roupas que possuem
um homem mais velho
me diz que nada vale a pena
e não me deixa concordar
mas o amor
esse algodão encharcado de sangue quente
coagula, como o sol é bonito!
segunda-feira, 9 de janeiro de 2017
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