daqui a quatro séculos
o que fica disto ainda
é mistério
se os traços de agrotóxico
Chernobyl e Fukushima
a cura do câncer
carbono catorze
um tempo em que se cria
na expansão do universo
o impeachment da Dilma
petróleo, GPS
quantos analistas políticos serão lembrados
as eleições do próximo domingo decidirão
que temas mais diremos
nos próximos quatro anos
mas não tem
eleição que defina
daqui a quatro séculos
o escritor congratula-se
dizendo que com certeza
lerão Vidas secas
se Shakespeare existe hoje
daqui a quatrocentos anos
quem sabe
as silhuetas de Brasília
e da bossa nova
seremos clássicos?
e o nome de quem
estará preso nas palavras
da língua futura?
trabalhar pra garantir
o esquecimento e a morte
terá recompensa?
e desta tarde gasta
pensando o impensável
vai restar algo?
quinta-feira, 29 de setembro de 2016
segunda-feira, 26 de setembro de 2016
tudo acabou antes que eu chegasse
bem-vindo após o fim, é assim
tem tantos ratos pelas ruas da cidade
interpelo perguntando onde foram
parar as onças capivaras mesmo os gatos
eles respondem de má vontade
sei lá
enquanto isso você tenta fazer algo que preste
assina os contratos do futuro inconteste
os ratos roem o futuro e tudo nele
não é culpa deles
caráter é destino, diz o astrólogo
melancólico eu olho a sujeira do rio que passa
e atravesso a vida a nada
como admiro esses pequenos mamíferos
sem indivíduo sem diploma sem cardápio
estrelas cinzas do chão de suas camadas
fios elétricos dançam presos
no céu da cidade o que existe era previsto
nos bueiros o que vem é sempre o mesmo
eduquemo-nos com aquilo que sobrevive
o entendimento um bicho sujo esperando
a hora certa de sair do esgoto sem ser morto
bem-vindo após o fim, é assim
tem tantos ratos pelas ruas da cidade
interpelo perguntando onde foram
parar as onças capivaras mesmo os gatos
eles respondem de má vontade
sei lá
enquanto isso você tenta fazer algo que preste
assina os contratos do futuro inconteste
os ratos roem o futuro e tudo nele
não é culpa deles
caráter é destino, diz o astrólogo
melancólico eu olho a sujeira do rio que passa
e atravesso a vida a nada
como admiro esses pequenos mamíferos
sem indivíduo sem diploma sem cardápio
estrelas cinzas do chão de suas camadas
fios elétricos dançam presos
no céu da cidade o que existe era previsto
nos bueiros o que vem é sempre o mesmo
eduquemo-nos com aquilo que sobrevive
o entendimento um bicho sujo esperando
a hora certa de sair do esgoto sem ser morto
sexta-feira, 16 de setembro de 2016
o século vinte foi embora
e deixou com a gente essas palavras
que a gente não sabe o que fazer
se eu digo xô palavras elas
não vão embora se eu digo
venham palavras elas não vêm
a própria noção de orfandade
é bem característica do século vinte
apesar de que não tinha internet
quando eu for contemporâneo
deste século há muito terei
morrido sem ter entendido nada
ó deus pra sempre morto me leve
pra um lugar onde não haja
calendário entendimento nem palavras
às pessoas do depois eu só desejo
melhor sorte ajustada ao seu tempo
certeza vocábulo século
vinte e dois
e deixou com a gente essas palavras
que a gente não sabe o que fazer
se eu digo xô palavras elas
não vão embora se eu digo
venham palavras elas não vêm
a própria noção de orfandade
é bem característica do século vinte
apesar de que não tinha internet
quando eu for contemporâneo
deste século há muito terei
morrido sem ter entendido nada
ó deus pra sempre morto me leve
pra um lugar onde não haja
calendário entendimento nem palavras
às pessoas do depois eu só desejo
melhor sorte ajustada ao seu tempo
certeza vocábulo século
vinte e dois
quinta-feira, 15 de setembro de 2016
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
primeiro um bombom
depois urubu
depois furta-cor
então resta-um
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
um fora do tom
um de urucum
um dia marrom
um dia azul
às vezes sem som
às outras sem pum
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
tem uns que têm deus
em cima do mundo
e outros ateus
a cada segundo
tem dia pastoso
tem dia felpudo
tem dia que é claro
tem dia que é escuro
tem dia trabalho
e noite com sono
às vezes eu quero
às vezes nem tanto
às vezes consigo
às vezes com canto
um dia eu paro
no outro instigo
tem dia boboca
tem dia amigo
tem dia que esqueço
que é só mais um
tem dia que eu vou
tem dia que eu fui
tem dia que tá
tem dia que intui
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
tem dia que é ruim
primeiro um bombom
depois urubu
depois furta-cor
então resta-um
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
um fora do tom
um de urucum
um dia marrom
um dia azul
às vezes sem som
às outras sem pum
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
tem uns que têm deus
em cima do mundo
e outros ateus
a cada segundo
tem dia pastoso
tem dia felpudo
tem dia que é claro
tem dia que é escuro
tem dia trabalho
e noite com sono
às vezes eu quero
às vezes nem tanto
às vezes consigo
às vezes com canto
um dia eu paro
no outro instigo
tem dia boboca
tem dia amigo
tem dia que esqueço
que é só mais um
tem dia que eu vou
tem dia que eu fui
tem dia que tá
tem dia que intui
tem dia que é bom
tem dia que é ruim
quarta-feira, 14 de setembro de 2016
Desdobramentos da história do flautista de Hamelin
1. Os ratos voltaram. Agora a cidade só tem velhos arrependidos, nunca mais nasceu uma criança. Os ratos roem a pele dos moribundos que morrem aos pouquinhos, de hemorragia e de horror. Som de flauta alegre na distância.
2. O flautista continuou de vila em vila. Daqui eu expulso os cachorros: toca a música, com rabos abanando os bichos vão e se jogam no lago e se afogam. Depois que desisti de ganhar dinheiro com o meu talento, só acho graça. Na vila seguinte vou afogar os canhotos. Na outra, os flautistas.
3. Vilões enfurecidos perseguem o flautista, agarram ele. Costuram-lhe os lábios, cortam-lhe a língua, quebram com martelo seus dedos dos pés. Depois amarram quase morto no poste do centro da cidade e deixam o sol e os urubus fazerem o resto. É incrível como, se você fizer do jeito certo, o cadáver não fede. Curiosamente, nenhum rato chega perto.
4. A vila das crianças adolesce e fica adulta. Todos sabem tocar flauta. Uma vez por ano, fazem grande festa pra celebrar a fundação. O povoado cresce, vira um país, agora tem exército e programação televisiva no domingo. Os pequenos vão pra escola com um rato desenhado no broche. Um grande rato de ouro ocupa a praça principal em frente ao palácio do governo.
5. Dizem que nas noites de lua cheia você pode escutar o som da flauta assoprando no vento. Quem segue a melodia, sem querer igual sonâmbulo, acorda num cano de esgoto iluminado pelos reflexos dos raios do luar. Encontra à frente o flautista sentado num trono, crianças e ratos cantam e dançam ao redor. Se você não for rato nem criança, vai desejar morrer afogado antes que o resto aconteça.
2. O flautista continuou de vila em vila. Daqui eu expulso os cachorros: toca a música, com rabos abanando os bichos vão e se jogam no lago e se afogam. Depois que desisti de ganhar dinheiro com o meu talento, só acho graça. Na vila seguinte vou afogar os canhotos. Na outra, os flautistas.
3. Vilões enfurecidos perseguem o flautista, agarram ele. Costuram-lhe os lábios, cortam-lhe a língua, quebram com martelo seus dedos dos pés. Depois amarram quase morto no poste do centro da cidade e deixam o sol e os urubus fazerem o resto. É incrível como, se você fizer do jeito certo, o cadáver não fede. Curiosamente, nenhum rato chega perto.
4. A vila das crianças adolesce e fica adulta. Todos sabem tocar flauta. Uma vez por ano, fazem grande festa pra celebrar a fundação. O povoado cresce, vira um país, agora tem exército e programação televisiva no domingo. Os pequenos vão pra escola com um rato desenhado no broche. Um grande rato de ouro ocupa a praça principal em frente ao palácio do governo.
5. Dizem que nas noites de lua cheia você pode escutar o som da flauta assoprando no vento. Quem segue a melodia, sem querer igual sonâmbulo, acorda num cano de esgoto iluminado pelos reflexos dos raios do luar. Encontra à frente o flautista sentado num trono, crianças e ratos cantam e dançam ao redor. Se você não for rato nem criança, vai desejar morrer afogado antes que o resto aconteça.
segunda-feira, 12 de setembro de 2016
quero me lavar
mas a água é suja
e eu no banho
de saia justa
mais me sujo
que me lavo
tomara que surja
um sabão raro
de efeito mágico
de cheiro certo
que me tire
deste aperto
enquanto isso
eu me visto
de água imunda
e se me sujo
estou mais limpo
do que ela
então a limpo
e que assim seja
mas a água é suja
e eu no banho
de saia justa
mais me sujo
que me lavo
tomara que surja
um sabão raro
de efeito mágico
de cheiro certo
que me tire
deste aperto
enquanto isso
eu me visto
de água imunda
e se me sujo
estou mais limpo
do que ela
então a limpo
e que assim seja
domingo, 11 de setembro de 2016
queimar as berinjelas comer elas
com o cu que acabou de se acabar receber
as fezes os amores que se podem fazer
olhar o sol no efeito sobre as coisas
nunca mais cortar as unhas as desculpas
não pedir além do roubo e do foda-se
que estranhas as óbvias vontades
que o nada me queira eu o quero
a vida uma palavra coincida
com algo que se possa dizer dela
com o cu que acabou de se acabar receber
as fezes os amores que se podem fazer
olhar o sol no efeito sobre as coisas
nunca mais cortar as unhas as desculpas
não pedir além do roubo e do foda-se
que estranhas as óbvias vontades
que o nada me queira eu o quero
a vida uma palavra coincida
com algo que se possa dizer dela
domingo, 4 de setembro de 2016
#ForaTemer
(exercício em versinhos depois de ver que o ~governo~ teve a ~brilhante ideia~ de criar a hashtag "bora temer" pra se contrapor ao grito #FORATEMER)
MARQUETEIRO DO ~GOVERNO~:
Basta de temer!
Beabá agora:
biarticular
(bucéfalos, embora)
boas intenções
- e ba be bi bu bora!
RESPOSTA RAZOÁVEL:
Não é assim, fofa,
feito mera gafe,
que vais fazer o fim
da hora do sifu.
Agora sem abafo
faz-se fé faz-se fiau
fumaça só aflora
- o fa fe fi fu FORA!
MARQUETEIRO DO ~GOVERNO~:
Basta de temer!
Beabá agora:
biarticular
(bucéfalos, embora)
boas intenções
- e ba be bi bu bora!
RESPOSTA RAZOÁVEL:
Não é assim, fofa,
feito mera gafe,
que vais fazer o fim
da hora do sifu.
Agora sem abafo
faz-se fé faz-se fiau
fumaça só aflora
- o fa fe fi fu FORA!
sábado, 3 de setembro de 2016
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