quando olho o cachorro, sei que a vida tem uma substância própria e alheia a si mesma, uma inteligência sem palavras que adapta a matéria à insistência e à finitude. então o cachorro vem até mim e reconheço os critérios da comunicação, que a vida se interliga a outras coisas, inclusive outras vidas, de modo quase mineral.
ponho a mão no cachorro. ele me lambe ou passa o focinho gelado no meu braço. então perco todo o conhecimento prévio da vida. ela não é mais que afeto e lambidas. algo parecido acontece quando o cachorro late de madrugada e me acorda. então quero afogar ele na bacia, e a vida é só raiva incontida e despertares incômodos.
se não fosse o cachorro, eu teria que saber de mim e não conseguiria. não sei se suportaria a frustração. ou conseguiria. aí, se alguém me olhasse de longe, veria: um cachorro.
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