segunda-feira, 7 de abril de 2014

A noite do não saber

Se ela desse um nome ao bicho, chamaria de Rigor. Todo ser humano tem direito a um nome, felizmente os bichos não nos conhecem, passam a vida sobre suas patas com o focinho à frente, ao menos grande parte deles, e nenhum é muito rigoroso a não ser com seu próprio acaso, traçado longe da gente. Aquele morreu antes do nome. A dona, que não era dona de mais ninguém, talvez de si, após chorar, concluiu que precisava de outro gato, antes que precisava enterrar aquele, antes que não adiantava dar um nome - e tão original - a algo que não atenderia, e em algum lugar no meio pensou: mas pra que qualquer coisa tem um nome?

Chamou-se à noite pra ter certeza de que ainda estava ali. Num apartamento só dela, entre paredes que ao breu não importa o quanto estão decoradas, fecha os olhos e subtrai-se não importa muita coisa, uma boa noite de sono, Clara. Chama, sussurra de novo. A quem responder se é só você? Perdeu-se no sono e depois amanheceu e voltou a anoitecer, ela insistentemente viva, tão sem gato. Pano rápido, novamente um colchão, a cidade lá embaixo sem controle, ouve chamarem-na no escuro era seu pai, um grande gato amarelo e gordo, imóvel confortável, prendendo-a sob a pata macia o rosto dela, um susto acorda. Vai cair do prédio, vai mudar, vai seguir vivendo ali com muitas outras histórias algumas permanecem, sucessão de amanheceres, um dia seu nome na boca de outro, deixe o gato descansar em paz.

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